A experiência de perder uma
gravidez desejada é algo que machuca, principalmente quando o aborto fica
retido. Aos dois meses descobri que meu bebê parou de evoluir e mesmo assim precisei ficar mais cinco dias esperando expelir naturalmente; nada mais para evitar infecção. O prazo passou, o embrião permanecia comigo e a
curetagem foi inevitável.
Durante esses cinco dias a dor
era imensa, não dor física, sentia dor no coração, dor na minha alma, não havia
nada que eu pudesse fazer a não ser chorar. Acordava durante a madrugada
achando que era um sonho, e logo lembrava que era um pesadelo real.
Finalmente chegou o dia da
curetagem. Assim como eu várias mulheres aguardavam internação na recepção do
hospital. Todas grávidas e felizes, prestes a terem seus bebês; o único caso de
curetagem era o meu.
Foi muito difícil dividir o mesmo espaço com aquelas
mulheres que alisavam a barriga e sentia o bebê mexer. O meu estava morto e
mesmo que eu quisesse acaricia-lo ele nada sentiria. Minha angustia aumentava,
elas seguravam a barriga, eu segurava o choro e o nó na garganta se formava
como prova da minha profunda tristeza.
O tratamento dos funcionários do
hospital também era diferenciado desde a recepção. Esperei por quase duas horas
para ser realmente internada, todas as grávidas subiam pra sala anti parto e só
eu permanecia na recepção, esqueceram-se da medicação prévia conforme solicitação
médica, tratavam-me como se eu tivesse cometido algum crime.
A única pessoa que me tratou bem
foi a enfermeira que colocou o soro. Por ironia do destino também estava
grávida e revelou conhecer minha dor por já ter passado pelo mesmo problema.
Segui para sala de parto como
toda grávida, com roupas adequadas ao bloco cirúrgico. O anestesista chegou e
me fez algumas perguntas, afastando-se para fora do bloco. Minha obstetra foi
até seu encontro e conversaram um pouco sobre mim. Ouvi-a explicando que aquele
filho foi desejado, que o aborto não foi provocado e que meu corpo não o expulsava.
Ele voltou pra perto de mim, pediu licença para pegar na minha barriga e me fez
um carinho como que estava com pena de mim e falou: eu sinto muito.
Fui sedada, adormeci e quando
acordei já estava na sala de recuperação com mais quatro mulheres. Todas sentiam
dor, mas estavam felizes por saberem que seus bebês estavam no berçário. Eu sentia
a mesma dor que se somava a tristeza de saber que meu bebê não existia mais.
A enfermeira se dirigia a cada
paciente dando notícias dos seus filhos, o médico perguntava para cada uma se já
tinham leite. Eu parecia estar invisível pra eles, até que o telefone tocou duas vezes,
era alguém querendo notícias minha, foi quando lembrei que ainda existo e que
alguém se importa comigo.
Eu precisava sair dali, virar
aquela página da minha vida e começar a escrever uma nova história.